domingo, 1 de setembro de 2013

FUNÇÃO JURISDICIONAL E PODER JUDICIARIO NACIONAL

1. Função jurisdicional

Como sabido, a jurisdição é atividade por via da qual se manifesta uma das funções políticas do Estado: a função judicial ou jurisdicional. Através dela, o Estado, que deve ser provocado, substituindo-se às partes e de forma imparcial, compõem os conflitos ocorrentes, de interesse ou não, e declara o direito aplicável ao caso, podendo, inclusive, executar suas próprias decisões.

Como função do Estado de declarar e realizar o direito diante de uma situação controvertida visando solucioná-la, a jurisdição é uma atividade secundária (pois através dela o Estado realiza uma atividade que deveria ter sido primariamente e espontaneamente exercida pelas partes), instrumental (pois é o meio ou instrumento de que o próprio direito dispõe para impor-se obediência a todos), desinteressada (pois a jurisdição não cede a nenhum dos interesses envolvidos) e provocada (é atividade inicialmente inerte).

A diversidade das situações a remover e solucionar determina, por seu turno, a diversidade de jurisdição, apesar desta ser una e indivisível. De interesse, no entanto, a distinção da jurisdição, quanto à matéria, que pode ser ordinária e constitucional.

Nesse passo, a jurisdição constitucional deve ser compreendida como uma função responsável pela remoção e solução dos conflitos de natureza constitucional, pouco importando o órgão jurisdicional que a exerça, enquanto a jurisdição ordinária cuidaria de todos os demais conflitos, ostentando uma natureza residual.

O Brasil adota o sistema de unicidade de jurisdição. Isso significa que somente o Poder Judiciário tem jurisdição, ou seja, somente ele pode dizer, em caráter definitivo, o direito aplicável aos casos concretos litigiosos submetidos a sua apreciação. O Poder Judiciário divide-se basicamente em duas esferas: a Justiça Federal e a Justiça Estadual.

A função típica do Judiciário é a função jurisdicional, pela qual lhe compete, coercitivamente, em caráter definitivo, dizer e aplicar o Direito às controvérsias a ele submetidas. Entretanto, assim como os demais Poderes da República, o Judiciário também desempenha funções acessórias ou atípicas, de natureza administrativa e legislativa.

Não se consegue conceituar um verdadeiro Estado Democrático de Direito sem a existência de um Poder Judiciário autônomo e independente. A independência judicial constitui um direito fundamental dos cidadãos, incluindo aí o direito à tutela judicial e o direito ao processo e ao julgamento por um Tribunal independente e imparcial.

2. Órgãos do Poder Judiciário Brasileiro

Nos termos do art. 92 da CF, são órgãos do Poder Judiciário:

I - o Supremo Tribunal Federal;

I-A o Conselho Nacional de Justiça;

II - o Superior Tribunal de Justiça;

III - os Tribunais Regionais Federais e Juízes Federais;

IV - os Tribunais e Juízes do Trabalho;

V - os Tribunais e Juízes Eleitorais;

VI - os Tribunais e Juízes Militares;

VII - os Tribunais e Juízes dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.

O STF, o STJ, o TST, o TSE e o STM são órgãos de convergência, na medida em que, nos respectivos ramos do direito de que cuidam, têm eles a última palavra, fazendo com que as decisões do Judiciário convirjam para o que decidirem esses Tribunais[1].

Enquanto a classificação em órgãos de convergência se baseia nos ramos do direito, a classificação em órgãos de superposição esta leva em conta a divisão orgânica do Poder Judiciário. Assim, órgãos de superposição são aqueles que não pertencem a nenhum dos ramos do Poder Judiciário, isto é, o STF e o STJ.

Embora o STF e o STJ não pertençam a qualquer dos ramos do Poder Judiciário, suas decisões têm, no curso do processo, poder derrogatório sobre as decisões, no caso do STF, de todos os outros órgãos do Judiciário, e, no caso do STJ, de todos os órgãos da Justiça Comum, seja ela Federal ou Estadual/Distrital.

A EC nº45/04 extinguiu os tribunais de alçada, onde existiam, determinando que seus membros passem a integrar os tribunais de justiça dos respectivos estados-membros, respeitados a antiguidade e classe de origem.

O STF e os Tribunais Superiores têm jurisdição em todo o território nacional e, assim, como o Conselho Nacional de Justiça, têm sede na Capital Federal. O STF é o órgão máximo do Poder Judiciário, ocupando a digna posição de especial guardião da CF.

3. Garantias e vedações

As garantias atribuídas ao Judiciário assumem importantíssimo papel no cenário da tripartição de poderes, assegurando-lhe a independência para decidir livremente, sem se abalar com qualquer tipo de pressão que venha dos outros poderes.

José Afonso da Silva[2] divide tais garantias em:

·Garantias funcionais: também chamadas de garantias da magistratura, asseguram a independência e a imparcialidade dos membros do Poder Judiciário no exercício da função jurisdicional;

·Garantias institucionais: assistem o próprio Judiciário como instituição política fundamental no Estado Democrático de Direito, e compreendem as garantias de autonomia orgânico-administrativa e financeira.

As garantias funcionais estão previstas no art. 95 da CF e podem ser assim dispostas:

·Garantias de independência dos juízes: vitaliciedade; inamovibilidade e irredutibilidade de vencimentos;

·Garantias de imparcialidade dos juízes, que se expressam por meio das seguintes vedações: 1) exercer, ainda que em disponibilidade, outro cargo ou função, salvo uma de magistério; 2) receber, a qualquer título ou pretexto, custas ou participação em processo; 3) dedicar-se à atividade político partidária; 4) receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; 5) exercer a advocacia no juízo ou tribunal do qual se afastou, antes de decorridos três anos do afastamento do cargo por aposentadoria ou exoneração.

Pela vitaliciedade, prevista no art. 95, I, o juiz, após dois anos de exercício (no primeiro grau) só pode perder o cargo em virtude de sentença judicial transitada em julgado. Antes de dois anos, estando o magistrado em período de estágio probatório, a perda do cargo pode operar-se por deliberação do Tribunal a que o juiz estiver vinculado. Nos Tribunais, a vitaliciedade é automática com a posse no cargo, não havendo estágio probatório.

Através da regra da inamovibilidade (art. 95, II), garante-se ao Juiz a impossibilidade de remoção, sem seu consentimento, de um local para outro, de uma comarca para outra, ou mesmo sede, cargo, tribunal, câmara, grau de jurisdição. Esta regra não é absoluta, pois, como estabelece o art. 93, VIII, o magistrado poderá ser removido (além de colocado em disponibilidade e aposentado), por interesse público, fundando-se tal decisão por voto da maioria absoluta do respectivo Tribunal ou do CNJ, assegurada ampla defesa.

A irredutibilidade de subsídios, por fim, prevista no art. 95, III, almeja garantir aos magistrados a necessária tranquilidade para o exercício do cargo, protegendo-o de perseguições governamentais de natureza econômica. Vale ressaltar que o STF já se pronunciou no sentido de tratar-se de garantia nominal e não real, ou seja, os magistrados não estão livres da corrosão de seus subsídios pela inflação.

As garantias institucionais são conferidas pela CF aos Tribunais, dotando-os de garantia de autonomia orgânico-administrativa, que compreende a sua independência na organização e funcionamento de seus órgãos e serviços e de garantia de autonomia financeira, que abrange a sua independência na elaboração das propostas orçamentárias e execução de seus orçamentos.

Assim, a garantia de autonomia orgânico-administrativa, prevista no art. 96 da CF, revela-se na competência privativa conferida:

·Aos tribunais: a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos; b) organizar suas secretarias e serviços auxiliares e os dos juízos que lhes forem vinculados, velando pelo exercício da atividade correicional respectiva; c) prover, na forma prevista nesta Constituição, os cargos de juiz de carreira da respectiva jurisdição; d) propor a criação de novas varas judiciárias; e) prover, por concurso público de provas, ou de provas e títulos, obedecido o disposto no art. 169, parágrafo único, os cargos necessários à administração da Justiça, exceto os de confiança assim definidos em lei; f) conceder licença, férias e outros afastamentos a seus membros e aos juízes e servidores que lhes forem imediatamente vinculados;

·Ao Supremo Tribunal Federal, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169: a) a alteração do número de membros dos tribunais inferiores; b) a criação e a extinção de cargos e a remuneração dos seus serviços auxiliares e dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver; c) a criação ou extinção dos tribunais inferiores; d) a alteração da organização e da divisão judiciárias;

·Aos Tribunais de Justiça julgar os juízes estaduais e do Distrito Federal e Territórios, bem como os membros do Ministério Público, nos crimes comuns e de responsabilidade, ressalvada a competência da Justiça Eleitoral.

A garantia de autonomia financeira, tal como estabelecida no art. 99 da CF, consiste no poder que se atribui ao Judiciário de elaborar sua proposta orçamentária, em face do que:

·Os tribunais elaborarão suas propostas orçamentárias dentro dos limites estipulados conjuntamente com os demais Poderes na lei de diretrizes orçamentárias (§1º);

·O encaminhamento da proposta, ouvidos os outros tribunais interessados, compete:I - no âmbito da União, aos Presidentes do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, com a aprovação dos respectivos tribunais; II - no âmbito dos Estados e no do Distrito Federal e Territórios, aos Presidentes dos Tribunais de Justiça, com a aprovação dos respectivos tribunais (§2º).

Se os órgãos referidos acima não encaminharem as respectivas propostas orçamentárias dentro do prazo estabelecido na lei de diretrizes orçamentárias, o Poder Executivo considerará, para fins de consolidação da proposta orçamentária anual, os valores aprovados na lei orçamentária vigente, ajustados de acordo com os limites estipulados na forma do § 1º deste artigo.

Se as propostas orçamentárias forem encaminhadas em desacordo com os limites estipulados na forma do § 1º, o Poder Executivo procederá aos ajustes necessários para fins de consolidação da proposta orçamentária anual.

Durante a execução orçamentária do exercício, não poderá haver a realização de despesas ou a assunção de obrigações que extrapolem os limites estabelecidos na lei de diretrizes orçamentárias, exceto se previamente autorizadas, mediante a abertura de créditos suplementares ou especiais.

Como garantia assecuratória da autonomia financeira, a CF/88 estabelece em seu art. 168 que os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário e do Ministério Público, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9º.

4. Estatuto da Magistratura

O Estatuto da Magistratura consiste num conjunto de normas constitucionais e legais, destinadas à disciplina da carreira da magistratura, forma e requisitos de acesso, critérios de promoção, aposentadoria, subsídio, vantagens, direitos, deveres, responsabilidades, impedimentos e outros aspectos relacionados à atividade de magistrado.

Em consonância com o art. 93 da CF, Lei Complementar, de iniciativa do STF, disporá sobre o Estatuto da Magistratura, observando os princípios enumerados na Carta Constitucional. O STF já decidiu que a aplicabilidade das normas e princípios inscritos no art. 93 independe da promulgação do Estatuto, em face do caráter de plena e integral eficácia de que se revestem aqueles preceitos.

Os princípios são os seguintes:

I - ingresso na carreira, cujo cargo inicial será o de juiz substituto, mediante concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as fases, exigindo-se do bacharel em direito, no mínimo, três anos de atividade jurídica e obedecendo-se, nas nomeações, à ordem de classificação;

II - promoção de entrância para entrância, alternadamente, por antigüidade e merecimento, atendidas as seguintes normas:

·É obrigatória a promoção do juiz que figure por três vezes consecutivas ou cinco alternadas em lista de merecimento;

·A promoção por merecimento pressupõe dois anos de exercício na respectiva entrância e integrar o juiz a primeira quinta parte da lista de antiguidade desta, salvo se não houver com tais requisitos quem aceite o lugar vago;

·Aferição do merecimento conforme o desempenho e pelos critérios objetivos de produtividade e presteza no exercício da jurisdição e pela frequência e aproveitamento em cursos oficiais ou reconhecidos de aperfeiçoamento;

·Na apuração de antiguidade, o tribunal somente poderá recusar o juiz mais antigo pelo voto fundamentado de dois terços de seus membros, conforme procedimento próprio, e assegurada ampla defesa, repetindo-se a votação até fixar-se a indicação;

·Não será promovido o juiz que, injustificadamente, retiver autos em seu poder além do prazo legal, não podendo devolvê-los ao cartório sem o devido despacho ou decisão;

III o acesso aos tribunais de segundo grau far-se-á por antiguidade e merecimento, alternadamente, apurados na última ou única entrância;

IV previsão de cursos oficiais de preparação, aperfeiçoamento e promoção de magistrados, constituindo etapa obrigatória do processo de vitaliciamento a participação em curso oficial ou reconhecido por escola nacional de formação e aperfeiçoamento de magistrados;

V - o subsídio dos Ministros dos Tribunais Superiores corresponderá a noventa e cinco por cento do subsídio mensal fixado para os Ministros do Supremo Tribunal Federal e os subsídios dos demais magistrados serão fixados em lei e escalonados, em nível federal e estadual, conforme as respectivas categorias da estrutura judiciária nacional, não podendo a diferença entre uma e outra ser superior a dez por cento ou inferior a cinco por cento, nem exceder a noventa e cinco por cento do subsídio mensal dos Ministros dos Tribunais Superiores, obedecido, em qualquer caso, o disposto nos arts. 37, XI, e 39, § 4º;

VI - a aposentadoria dos magistrados e a pensão de seus dependentes observarão o disposto no art. 40;

VII - o juiz titular residirá na respectiva comarca, salvo autorização do tribunal;

VIII - o ato de remoção, disponibilidade e aposentadoria do magistrado, por interesse público, fundar-se-á em decisão por voto da maioria absoluta do respectivo tribunal ou do Conselho Nacional de Justiça, assegurada ampla defesa;

VIII-A - a remoção a pedido ou a permuta de magistrados de comarca de igual entrância atenderá, no que couber, ao disposto nas alíneas a , b , c e e do inciso II;

IX - todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação;

X - as decisões administrativas dos tribunais serão motivadas e em sessão pública, sendo as disciplinares tomadas pelo voto da maioria absoluta de seus membros;

XI - nos tribunais com número superior a vinte e cinco julgadores, poderá ser constituído órgão especial, com o mínimo de onze e o máximo de vinte e cinco membros, para o exercício das atribuições administrativas e jurisdicionais delegadas da competência do tribunal pleno, provendo-se metade das vagas por antiguidade e a outra metade por eleição pelo tribunal pleno;

XII - a atividade jurisdicional será ininterrupta, sendo vedado férias coletivas nos juízos e tribunais de segundo grau, funcionando, nos dias em que não houver expediente forense normal, juízes em plantão permanente;

XIII - o número de juízes na unidade jurisdicional será proporcional à efetiva demanda judicial e à respectiva população;

XIV - os servidores receberão delegação para a prática de atos de administração e atos de mero expediente sem caráter decisório;

XV a distribuição de processos será imediata, em todos os graus de jurisdição.

[1] DINAMARCO, Instituições de direito processual civil, v. 1, p. 368.
[2] José Afonso da Silva, Curso.... p. 502.




quinta-feira, 1 de agosto de 2013

SISTEMAS DE GOVERNO E PODER EXECUTIVO NO BRASIL

1. Sistemas de governo

Os sistemas de governo são fórmulas concebidas para identificar o grau de independência ou dependência no relacionamento entre os Poderes Executivo e o Legislativo no exercício das funções governamentais. Num regime de total independência política entre os aludidos poderes, há o sistema presidencial; porém, num regime de relativa dependência política, há o sistema parlamentar.
O presidencialismo se originou nos EUA, com a Constituição de 1787, motivado pela ideia da consagração de um Executivo independente do Legislativo, tal como teorizado por Montesquieu.
Esse sistema é comumente adotado nas Repúblicas, onde o Presidente da República exerce o Poder Executivo em sua totalidade, concentrando as funções próprias do Executivo, quais sejam as chefias de Estado, chefia de Governo e chefia da Administração Pública. O Presidente passa a ter mandato por tempo fixo, razão por que não há necessidade de depender da confiança do Legislativo, nem para a sua investidura, nem para o exercício do governo, nem para a permanência no poder.
O parlamentarismo teve origem na Inglaterra, resultado de uma longa experiência histórica que se iniciou no século XIII.
É típico sistema das Monarquias constitucionais. No parlamentarismo, o Poder Executivo está dividido entre um chefe de Estado (Monarca ou Presidente) e um chefe de Governo (Primeiro-Ministro ou Presidente do Conselho de Ministros), indicado pelo Presidente ou Monarca.
A investidura do chefe de Governo, bem como a sua permanência no cargo, dependem da confiança do parlamento. A aprovação do Primeiro-Ministro e do Gabinete se dá pela aprovação de um plano de governo, com o qual a Câmara acaba assumindo responsabilidade pelo Governo.
           
Poder Executivo no Brasil

O sistema presidencialista é de nossa tradição republicana, de modo que o Poder Executivo no Brasil é exercido na sua plenitude pelo Presidente da República, que concentra todas as funções, abrangentes da chefia de Estado, de Governo e de Administração.
Consagrou-se, entre nós, um Executivo monocromático, na medida em que todas as suas funções são exercidas por uma só pessoa, que não depende da confiança do Congresso Nacional para ser investido no cargo nem nele permanecer, pois é eleito para um mandato fixo de 4 anos.
Em razão da forma federativa de Estado, o Poder Executivo nos Estados, no DF e nos Municípios é exercido, respectivamente e na linha do sistema presidencial de governo, pelos Governadores e Prefeitos, que também concentram as funções atinentes a esse poder no âmbito de seus domínios e competências.

2. Presidente e Vice-Presidente da República

O Presidente e o Vice-Presidente da República são eleitos pelo sistema eleitoral majoritário, pelo qual se consagra vencedor aquele que houver obtido maior número de votos, segundo procedimento fixado na CF.
O Presidente é eleito simultaneamente com um Vice-Presidente, por meio de um sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, em eleição realizada no 1º domingo de outubro, em primeiro turno, e no último domingo de outubro, em segundo turno, se houver necessidade deste, do ano anterior ao término do mandato presidencial vigente, para mandato de quatro anos, permitida a reeleição para um único período subseqüente.
Será considerado eleito Presidente o candidato que, registrado por partido político, obtiver a maioria absoluta dos votos, não computados os brancos e os nulos. Se nenhum candidato obtiver a maioria absoluta na primeira votação, far-se-á nova eleição, na qual concorrerão os dois candidatos mais votados, hipótese em que será eleito o candidato que obtiver a maioria dos votos válidos.
Na hipótese de haver o segundo turno, se antes de sua realização ocorrer morte, desistência ou impedimento legal de candidato, deve-se convocar, dentre os remanescentes, o de maior votação. Se, na hipótese de segundo turno, remanescer, em segundo lugar, mais de um candidato com a mesma votação, qualificar-se-á o mais idoso.
A posse do Presidente e do Vice ocorre em 1º de janeiro, em sessão conjunta do Congresso Nacional, na qual devem prestar compromisso de manter, defender e cumprir a CF, observar as leis, promover o bem geral do povo brasileiro, sustentar a união, a integridade e a independência do Brasil.
Se decorridos 10 dias da data fixada para a posse, e o Presidente ou o Vice não tiver assumido o cargo, este será declarado vago, salvo motivo de força maior que justifique a ausência.

Substituirá o Presidente, no caso de impedimento, e suceder- lhe-á, no de vaga, o Vice-Presidente. A substituição, que tem caráter provisório, ocorre em caso de impedimento, enquanto a sucessão, que tem natureza definitiva, em caso de vaga.
O Vice-Presidente da República, além de outras atribuições que lhe forem conferidas por lei complementar, auxiliará o Presidente, sempre que por ele convocado para missões especiais.
Em caso de impedimento do Presidente e do Vice-Presidente, ou vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício da Presidência o Presidente da Câmara dos Deputados, o do Senado Federal e o do Supremo Tribunal Federal.
Vagando os cargos de Presidente e Vice-Presidente da República, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga. Ocorrendo a vacância nos últimos dois anos do período presidencial, a eleição para ambos os cargos será feita trinta dias depois da última vaga, pelo Congresso Nacional, na forma da lei. Em qualquer dos casos, os eleitos deverão completar o período de seus antecessores.
O Presidente e o Vice-Presidente da República não poderão, sem licença do Congresso Nacional, ausentar-se do País por período superior a quinze dias, sob pena de perda do cargo.
A CF estabelece, no art. 84, as atribuições privativas do Presidente, a saber:
I - nomear e exonerar os Ministros de Estado;
II - exercer, com o auxílio dos Ministros de Estado, a direção superior da administração federal;
III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição;
IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução;
V - vetar projetos de lei, total ou parcialmente;
VI - dispor, mediante decreto[1], sobre:
a) organização e funcionamento da administração federal, quando não implicar aumento de despesa nem criação ou extinção de órgãos públicos;
b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos;
VII - manter relações com Estados estrangeiros e acreditar seus representantes diplomáticos;
VIII - celebrar tratados, convenções e atos internacionais, sujeitos a referendo do Congresso Nacional;
IX - decretar o estado de defesa e o estado de sítio;
X - decretar e executar a intervenção federal;
XI - remeter mensagem e plano de governo ao Congresso Nacional por ocasião da abertura da sessão legislativa, expondo a situação do País e solicitando as providências que julgar necessárias;
XII - conceder indulto e comutar penas, com audiência, se necessário, dos órgãos instituídos em lei;
XIII - exercer o comando supremo das Forças Armadas, nomear os Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, promover seus oficiais-generais e nomeá-los para os cargos que lhes são privativos; XIV - nomear, após aprovação pelo Senado Federal, os Ministros do Supremo Tribunal Federal e dos Tribunais Superiores, os Governadores de Territórios, o Procurador-Geral da República, o presidente e os diretores do banco central e outros servidores, quando determinado em lei;
XV - nomear, observado o disposto no art. 73, os Ministros do Tribunal de Contas da União;
XVI - nomear os magistrados, nos casos previstos nesta Constituição, e o Advogado-Geral da União;
XVII - nomear membros do Conselho da República, nos termos do art. 89, VII;
XVIII - convocar e presidir o Conselho da República e o Conselho de Defesa Nacional;
XIX - declarar guerra, no caso de agressão estrangeira, autorizado pelo Congresso Nacional ou referendado por ele, quando ocorrida no intervalo das sessões legislativas, e, nas mesmas condições, decretar, total ou parcialmente, a mobilização nacional;
XX - celebrar a paz, autorizado ou com o referendo do Congresso Nacional;
XXI - conferir condecorações e distinções honoríficas;
XXII - permitir, nos casos previstos em lei complementar, que forças estrangeiras transitem pelo território nacional ou nele permaneçam temporariamente;
XXIII - enviar ao Congresso Nacional o plano plurianual, o projeto de lei de diretrizes orçamentárias e as propostas de orçamento previstos nesta Constituição;
XXIV - prestar, anualmente, ao Congresso Nacional, dentro de sessenta dias após a abertura da sessão legislativa, as contas referentes ao exercício anterior;
XXV - prover e extinguir os cargos públicos federais, na forma da lei;
XXVI - editar medidas provisórias com força de lei, nos termos do art. 62;
XXVII - exercer outras atribuições previstas nesta Constituição.
Em consonância com o parágrafo único do art. 84, o Presidente da República poderá delegar as atribuições mencionadas nos incisos VI, XII e XXV, primeira parte, aos Ministros de Estado, ao Procurador-Geral da República ou ao Advogado-Geral da União, que observarão os limites traçados nas respectivas delegações.
As competências privativas do Presidente, acima aludidas, são, por força do federalismo, extensíveis, no que couber, aos demais chefes do Poder Executivo, nas esferas estadual, distrital e municipal.

Responsabilidade do Presidente da República

No sistema presidencial de governo, a responsabilidade do Presidente da República é a regra. Seguindo esse passo, a CF/88 prevê dois tipos de responsabilidades do Presidente da República: uma responsabilidade política e uma responsabilidade penal.
A responsabilidade política abrange os crimes de responsabilidade, que são infrações de natureza político-administrativa, que podem levar ao impeachment do Presidente. A responsabilidade penal compreende as infrações penais comuns previstas no CP e na lei penal especial, que podem acarretar na aplicação de penas privativas de liberdade, restritivas de direitos ou de multa.
A constituição considera como crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a CF e, especialmente, contra:
I - a existência da União;
II - o livre exercício do Poder Legislativo, do Poder Judiciário, do Ministério Público e dos Poderes constitucionais das unidades da Federação;
III - o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais;
IV - a segurança interna do País;
V - a probidade na administração;
VI - a lei orçamentária;
VII - o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
Esses crimes serão definidos em lei especial, que estabelecerá as normas de processo e julgamento. A Jurisprudência do STF entende que somente a União dispõe de competência para definição formal dos crimes de responsabilidade, pois estes se inserem, segundo o Tribunal, na competência privativa da União para legislar em matéria penal. Da mesma forma, também é competência privativa da União o estabelecimento das respectivas normas de processo e julgamento dos crimes de responsabilidade.
Nos crimes de responsabilidade, o Presidente será processado e julgado pelo Senado Federal, após admitida a acusação contra ele, por 2/3 da Câmara dos Deputados. Admitida a acusação, o Senado deve instaurar o processo político, não dispondo de qualquer faculdade de não fazê-lo.
Já nas infrações penais comuns, o Presidente será processado e julgado pelo STF, também após admitida a acusação contra ele, por 2/3 da Câmara dos Deputados. Entretanto, mesmo que admitida pela Câmera a acusação, o STF não está obrigado a receber a ação penal contra ele proposta. Não se exige autorização da Câmara para instauração de inquérito promovidos pela polícia judiciária, desde que essas medidas pré-processuais sejam adotadas no âmbito de procedimento investigativo em curso perante o STF.
De acordo com a CF, o Presidente ficará suspenso de suas funções:
I - nas infrações penais comuns, se recebida a denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal;
II - nos crimes de responsabilidade, após a instauração do processo pelo Senado Federal.
Como se vê, a simples autorização da Câmara para instauração do processo não implica na suspensão do Presidente de suas funções. Se, decorrido o prazo de cento e oitenta dias, o julgamento não estiver concluído, cessará o afastamento do Presidente, sem prejuízo do regular prosseguimento do processo.
No processo e julgamento do Presidente por crime de responsabilidade, o Senado Federal será presidido pelo Presidente do STF, limitando-se a condenação, que somente será proferida por 2/3 dos votos do Senado Federal, à perda do cargo, com inabilitação por 8 anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis.
O processo e julgamento perante o STF seguirão os termos da legislação penal e processual penal, podendo o Presidente ser condenado ou absolvido. Se absolvido, arquiva-se o processo. Se condenado, além de sua sujeição à pena imposta, pode perder o cargo por determinação da própria sentença ou pela suspensão dos direitos políticos.

Prerrogativas

O Presidente não pode ser preso enquanto não sobrevier sentença condenatória, nas infrações comuns.
Ademais, na vigência de seu mandato, o Presidente não pode ser responsabilizado por atos estranhos ao exercício de suas funções. Essa última prerrogativa, todavia, está limitada à responsabilidade penal, de modo que o Presidente só pode ser processado e julgado pelo STF por infração penal relacionada ao exercício de sua função, ou seja, por crimes funcionais.

Poder regulamentar

(A) Decretos de execução

Costumam ser definidos como regras jurídicas gerais, abstratas e impessoais, editadas em face de uma lei, concernentes à atuação da Administração, possibilitando a fiel execução da lei a que se refiram. Nos termos do art. 84, IV, da CF/88, compete privativamente ao Presidente expedir decretos e regulamentos para fiel execução das leis.

(B) Decretos autônomos

A CF expressamente prevê a edição de decretos como atos primários, diretamente hauridos de seu texto, independentemente de lei, consubstanciando a denominada “reserva de Administração”.
Os decretos autônomos só poderão ser editados em duas situações, a saber: 1) para dispor sobre a organização e funcionamento da Administração Federal, quando isso não implicar em aumento de despesa nem criação e extinção de órgãos públicos; 2) para extinguir cargos ou funções públicas, quando vagos.

(C) Decretos autorizados

São os atos regulamentares do Poder Executivo que, em vez de detalharem ou explicarem conteúdos legais implícitos, complementam a lei, com base em expressão determinação, nela contida, para que assim seja feito.
A doutrina em geral não admite a constitucionalidade do regulamento delegado ou autorizado, e o STF entende que é inconstitucional a delegação em branco.

Medidas Provisórias

As MP, com força de lei, podem ser adotadas pelo Presidente da República.  Permanecerão em vigor pelo prazo de 60 dias e serão submetidas, imediatamente, ao Poder Legislativo. Esse prazo contar-se-á da publicação da medida provisória e ficará suspenso durante os períodos de recesso do Congresso Nacional.
Prorrogar-se-á uma única vez por igual período a vigência de medida provisória que, no prazo de sessenta dias, contado de sua publicação, não tiver a sua votação encerrada nas duas Casas do Congresso Nacional.
Havendo, porém, convocação extraordinária, a apreciação das medidas provisórias deve ser incluída em pauta. para apreciação.
O Presidente não pode retirar da apreciação do Congresso MP recém editada; pode, contudo, revogá-la por outra MP.
Consoante súmula 651 do STF, a MP não apreciada pelo Congresso Nacional podia, até a EC 32/01, ser reeditada dentro do seu prazo de eficácia de 30 dias, mantidos os efeitos de lei desde a primeira edição.

Pressupostos de validade

Para as MPs serem legítimas, devem atender a pressupostos formais e materiais.
Os formais são a relevância e a urgência; os materiais dizem respeito à matéria que pode ser por elas regulamentada.
·                    Pressupostos formais: Segundo entendimento do STF, os pressupostos da urgência e da relevância, embora conceitos jurídicos relativamente indeterminados e fluidos, mesmo expondo-se, inicialmente, à avaliação discricionária do Presidente da República, estão sujeitos, ainda que excepcionalmente, ao controle do Poder Judiciário.
·                    Pressupostos materiais: Nos termos do §1º do art. 62, é vedada a edição de medidas provisórias sobre matéria: I - relativa a: a) nacionalidade, cidadania, direitos políticos, partidos políticos e direito eleitoral; b) direito penal, processual penal e processual civil; c) organização do Poder Judiciário e do Ministério Público, a carreira e a garantia de seus membros; d) planos plurianuais, diretrizes orçamentárias, orçamento e créditos adicionais e suplementares, ressalvado o previsto no art. 167, § 3º; II - que vise a detenção ou seqüestro de bens, de poupança popular ou qualquer outro ativo financeiro; III - reservada a lei complementar; IV - já disciplinada em projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional e pendente de sanção ou veto do Presidente da República.

Medida provisória que implique instituição ou majoração de impostos, exceto os previstos nos arts. 153, I, II, IV, V, e 154, II, só produzirá efeitos no exercício financeiro seguinte se houver sido convertida em lei até o último dia daquele em que foi editada.


Bibliografia
CUNHA, Dirley Jr. Curso de Direito Constitucional. 3.ed. Salvador: Jus Podium, 2009.





[1] Decreto autônomo